Alenterra

Há coisas que não se dizem, nem se insinuam. A vida não se diz, dizem. A vida é roupa que não se despe, ou que se despe apenas por uma vez. Há coisas que nem nos segredos devem aflorar. Coisas de nada, mas também outras coisas, densas, plúmbeas, excessivas. Como o remorso, o reverso do acto irreversível. Ou a dor, que mesmo descrita, não passa de retórica aos ouvidos dos outros. Sente‑se na carne, nos ossos, na pele, nas unhas, mas dela nada se pode dizer, porque ela existe para ser sentida nas entranhas. A palavra não a redime, nem a dissolve. Ou o silêncio, a ausência de palavras. Do silêncio não se fala sem o quebrar, sem o dissolver. O silêncio é o casulo da alma, seja ela o que for, esteja onde estiver. O silêncio é o deserto sem sombras, a luz oblíqua, o azul longínquo e quieto. O silêncio é a suprema abstracção, o zero, o nada absoluto. Quebra‑lo é desafiar os deuses. Por isso, dizer o invisível é uma impossibilidade. Restam as minudências, a ganga dos dias, e a banalidade, que é a meta dos medíocres. O que aqui vai é o trivial, pois não se consegue reinventar a vida. O que aqui fica é o pouco, porque não há alma para mais.

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Há coisas que não se dizem, nem se insinuam. A vida não se diz, dizem. A vida é roupa que não se despe, ou que se despe apenas por uma vez. Há coisas que nem nos segredos devem aflorar. Coisas de nada, mas também outras coisas, densas, plúmbeas, excessivas. Como o remorso, o reverso do acto irreversível. Ou a dor, que mesmo descrita, não passa de retórica aos ouvidos dos outros. Sente‑se na carne, nos ossos, na pele, nas unhas, mas dela nada se pode dizer, porque ela existe para ser sentida nas entranhas. A palavra não a redime, nem a dissolve. Ou o silêncio, a ausência de palavras. Do silêncio não se fala sem o quebrar, sem o dissolver. O silêncio é o casulo da alma, seja ela o que for, esteja onde estiver. O silêncio é o deserto sem sombras, a luz oblíqua, o azul longínquo e quieto. O silêncio é a suprema abstracção, o zero, o nada absoluto. Quebra‑lo é desafiar os deuses. Por isso, dizer o invisível é uma impossibilidade. Restam as minudências, a ganga dos dias, e a banalidade, que é a meta dos medíocres. O que aqui vai é o trivial, pois não se consegue reinventar a vida. O que aqui fica é o pouco, porque não há alma para mais.

Rogério Pires de Carvalho nasceu em 1948 no lugar de Zibreira, no concelho de Torres Novas. No ano imediato passou a viver com os padrinhos, com quem foi criado na cidade de Lisboa. Fez o curso liceal no Pedro Nunes e licenciou‑se em História na Faculdade de Letras. Anos mais tarde fez o curso de mestrado em Literatura e Cultura Portuguesa, na Universidade Nova. Trabalhou na Segurança Social, tendo posteriormente transitado para a carreira docente como professor do ensino secundário. Pelo meio, esteve alguns anos no extinto Instituto Português do Património, onde desempenhou funções como arqueólogo.

Entre 1969 e 1973 cumpriu o serviço militar obrigatório, tendo sido mobilizado para a então designada Província Ultramarina de Angola, onde permaneceu os dois anos de comissão na região Norte: os Dembos.

Dimensões (C x L x A)200 × 300 cm
Código de Barras

9789898455055

Escritor

Rogério Carvalho

Editora

ALFARROBA

Encadernação

Outro formato livro

Idioma

Português

Idade Mínima Recomendada

LITERATURA

Ano de Publicação

31-07-2010

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